sábado, 18 de setembro de 2010

O crack avança em Brasília (clique aqui e assista ao vídeo)

Brasília vive um dos piores, se não o pior, momento de sua história na atenção à saúde de sua população, em especial para àqueles que necessitam dos serviços públicos. Diariamente a mídia retrata o descaso que aflige milhares de pessoas que recorrem as unidades de saúde do DF.

No entanto, quando a questão de saúde está relacionada à saúde mental, e o pior quando está associada ao tratamento de usuários e dependentes de drogas o problema é potencializado, vez que a ausência de uma política de Estado para essa área no DF chegou a beira do absurdo. 

A cada situação apresentada pela mídia são anunciadas soluções mirabolantes.

No momento, lamentavelmente, o que se tenta fazer é remediar o irremediável, criando uma Subsecretaria de Políticas Públicas sobre Drogas, que mesmo fora de sua esfera já proclamou: “O Centro de Atenção Psicossocial para usuários de Álcool e Drogas de Ceilândia será mudado de lugar e passará a ter atendimento 24 horas, inclusive, com possibilidade de desintoxicação”.

Viva!!! Quem viver verá!

Para melhor ilustrar o cenário atual, poderíamos elencar vários casos, mas, o drama vivido nos dias 17 e 18/9 por duas crianças de Brasília exemplificam bem o que estamos falando.

Não fosse a determinação e persistência da Conselheira Tutelar Sra. Ana Luísa Palhares, o caso dessas crianças de 14 e 10 anos seria um a mais ser noticiado, possivelmente com desfecho trágico e esquecido rapidamente como tantos outros.  Diariamente, nas calçadas de Brasília tropeçamos nessas crianças que estão dormindo ou morrendo e ninguém faz nada, banalizando o sentido da vida e a relação com o que a de mais frágil: crianças em situação de risco.

Ninguém uma vírgula!

A romaria que passou a brava Ana Luísa certamente irá de alguma forma minimizar o drama dos garotos, porém a verdadeira via crúcis que viveu com as crianças denuncia o caos a que pais e mães estão sujeitos e há tempos vêm passando no DF, expressando total inoperância das políticas públicas para essa área.

Tal qual um jogo sarcástico, pavoroso e cruel - a cada serviço procurado - os garotos eram encaminhados para um outro local, onde a senha para as portas se fecharem eram as palavras: dependência química, usuários de drogas, uso de crack e outros sinônimos carregados de medo, despreparo e preconceito.

Mesmo sem um veículo adequado, tão pouco suporte técnico na área de saúde, a conselheira perambulou os corredores da saúde (da saúde?) com um dos garotos no colo totalmente desacordado (veja vídeo) e precisando de cuidados urgente.

- "Ninguém quer saber desses meninos da rodoviária, ninguém quer cuidar desses meninos usuários de drogas", constatou Ana Luíza.

Ao final do martírio, a equipe do HRAN “permitiu” (pasmem) que os meninos passassem a noite naquela Unidade de Saúde, ressaltando que o Hospital não tem condições de atender crianças e adolescentes viciados. "O Hospital não possui pessoal qualificado, não existe assistência específica para esse tipo de problema", afirmou anonimamente uma funcionária.

É verdade, lá como em qualquer ou local do DF não há lugar para crianças com problemas relacionados ao uso de drogas e, no caso daquela criança precisando de cuidados báiscos, segundo a funcionária do Hospital de Base "com certeza, ele vai embora sozinho, voltar para as ruas e continuar nas mesmas condições”.

De fato!

Os serviços de saúde do DF não possuem nenhuma condição técnica nem estrutural mínima que seja. Só quem precisou ou precisa de utilizar serviços públicos sabe o quanto estamos abandonados e jogados ao descaso.

Que pese os esforços sobre humano dos profissionais de saúde, de serviço social e administrativo, não se consegue dar uma atenção adequada a qualquer que seja a demanda apresentada. Seja uma simples gripe, uma dor de cabeça, qualquer mal estar que seja o melhor é rezar.

Não precisa ser um expert em dependência química para saber que um Hospital Geral é o melhor local onde, em situação ideal, esses garotos deveriam ter sido atendidos, independente de qual droga for, de qual patologia ou tipo de transtorno.

O que existe é o despreparo e o pré conceito.


Naquela unidade de saúde assim como em tantas outras, com certeza, essas crianças devem ou deveriam ter recebidos os primeiros socorros,  incluindo medidas que permitam manter um ser vivo isento de outros males.

Serem monitorados, hidratados e medicados quando da crise de abstinência chegar, o que certamente chegará. As crianças não precisavam de um psiquiatra infantil com especialização na França para cuidar do caso. Precisavam de um bom médico que junto com uma equipe multidisciplinar iria monitorar o quadro clínico e sua evolução. Precisavam de comida, roupas limpas e boas horas de sono. Precisavam de um local onde o serviço social deveria empenhar-se na tentativa de localizar seus familiares, buscar uma saída e quem sabe alguma esperança.

Tudo isso é muito triste e perspectivas não são boas. Mas, fica a esperança com o nome de Ana Luísa Palhares, exemplo de persistência e amor ao próximo, que extrapolando sua função pública, não aceitou que a burocracia a impedisse de buscar de forma determinante uma solução para o caso. Para este caso.

Fotos disponiveis nos sites:  geopedrados.blogspot.com e pavandesenvolvimento.com.br, acessado em 18set2010.

quinta-feira, 9 de setembro de 2010

A BANALIZAÇÃO DA VIDA (clique aqui)

A política de governo era distribuir cachimbos para minizar a transmissão de doenças e assim reduzir danos aos usuários.  Essa estratégia é respalda pela Política de Atenção Integral a Usuários de Álcool e Outras Drogas (2003), disponível em http://bvsms.saude.gov.br/bvs/publicacoes/pns_alcool_drogas.pdf  e pela PORTARIA Nº 1.059/GM DE 4 DE JULHO DE 2005, do Ministério da Saúde, que destina incentivo financeiro para o fomento de ações de redução de danos em Centros de Atenção Psicossocial para o Álcool e outras Drogas - CAPSad - e dá outras providências (disponível em http://dtr2001.saude.gov.br/sas/PORTARIAS/Port2005/GM/GM-1059.htm) .

A DESASISTÊNCIA INSTALADA (clique aqui)

Veja a forma como a rede pública está organizada para atender ao usuário de drogas e dependentes químicos.

terça-feira, 7 de setembro de 2010

FAZ DE CONTA NÃO TIRA CRACK DAS RUAS

O Ministério da Saúde estima em 600 mil os usuários de crack no país. Pelo que se vê pelas ruas e praças de cidades grandes, médias e pequenas, pela penetração inclusive nas zonas rurais e na população indígena, o número deve estar subestimado. É frustrante que, embora colocada na pauta de prioridade do governo federal, a droga continue se disseminando de forma devastadora, tendo se banalizado.

Pudera! A primeira cracolândia brasileira, surgida no centro da capital paulista no fim da década de 1980, continua lá. Este ano, numa única operação, mais de três dezenas de supostos traficantes foram indiciados e três centenas de viciados, detidos. Mas o tristemente famoso quadrilátero da mais populosa e rica megalópole nacional ainda abriga trastes humanos que, como zumbis, circulam com suas pedras e cachimbos, podendo ser vistos a qualquer dia ou hora.

Basta de faz de conta e de pirotecnias. A repressão pura e simples produz espetáculo, mas não resolve o problema. Da mesma forma, o solene anúncio de planos de ação que não saem do papel, a indignação que não vai além do discurso. O presidente da República já qualificou a droga como praga e prometeu “jogar duro” contra ela. No ano passado, lançou um programa. Este ano, outro. Sem resultados efetivos a exibir, pode-se dizer que, antes de somar, a segunda iniciativa apenas encobre, como um manto, o fracasso da primeira.

Instado a comparar os dois conjuntos de medidas, o chefe do Gabinete de Segurança Institucional, Jorge Armando Félix, em vez de apontar diferenças, classificou a segunda tentativa de “intensificação de esforços”. Que isso não signifique dobrar ou quintuplicar o nada. Barato e de alto poder de vício e destruição, o crack já rompeu todas as fronteiras. Antes restrito ao circuito dos marginalizados, hoje é objeto de desejo em qualquer classe social.

A fissura que a droga provoca é intensa e rápida. Por ela, rouba-se, mata-se, prostitui-se. Relacionamentos não resistem a ela. Toda a sociedade é afetada. Um beco tomado por usuários logo contamina o quarteirão, o bairro, a cidade. Recente em Brasília, apareceu nas redondezas da Rodoviária do Plano Piloto, passou a assustar moradores da Asa Norte e já é realidade em todo o Distrito Federal e entorno.

Sem coordenação efetiva dos poderes públicos — em nível federal, estadual e municipal —, com suas respectivas áreas de repressão, assistência e atendimento médico e psicossocial, o muito pouco que poderá ser feito não deterá o avanço da destruição protagonizada pelo crack. E é preciso ser realista: nem o controle do tráfico nas fronteiras nem a capacitação do Sistema Único de Saúde ocorrerão da noite para o dia. Tampouco a necessária conscientização da sociedade com intensas campanhas preventivas. O desafio é gigantesco e urgente. Mas o cidadão precisa começar a acreditar no engajamento e empenho das autoridades. Ou seja: não dá para falhar mais.

Fonte: Opinião. Visão do Correio. Correio Brasiliense. 7/set/2010.